16 de dez. de 2010

DENÚNCIA - ORÇAMENTO ANUAL DE 2011

MOVIMENTO RIO NOSSO: MAIS UM PASSO PARA O EXERCÍCIO DA CIDADANIA

Para ver a Ofício do MP de 12.07.11, CLIQUE AQUI
Para ver Ofício do MP de 07.10.11, CLIQUE AQUI.

Representantes do Movimento Rio Nosso protocolaram, na tarde de hoje, no Ministério Público, documentação requerendo que se apure “DENÚNCIA contra a Prefeitura Municipal de Muriaé, Câmara Municipal de Muriaé e Conselho Municipal de Planejamento e Desenvolvimento – COMUPLAN”, por Irregularidades no encaminhamento e aprovação do Orçamento Anual do Município para o exercício de 2011.
O documento ora protocolado é acompanhado de 21 assinaturas de cidadãos e cidadãs que entendem estar cumprindo um dever de cidadania.

FONTE: www.eliasmuratori.com.br








Muriaé (MG), 15 de dezembro de 2010

 
Ilustre Promotor.

 OS CIDADÃOS MURIAEENSES, ao final qualificados, participantes do Movimento O RIO NOSSO DE CADA DIA e sócios fundadores da Associação dos Amigos de Muriaé – AAMUR (em constituição), cumprindo um dever de cidadania, vem, respeitosamente, expor e apresentar-lhe a presente

DENÚNCIA DE IRREGULARIDADE

contra as instituições seguintes: Prefeitura Municipal de Muriaé (MG), Câmara Municipal de Muriaé (MG), e Conselho Municipal de Planejamento e Desenvolvimento – COMUPLAN.

2.                    O Orçamento Anual do Município para o exercício de 2011 foi remetido pelo Poder Executivo ao Poder Legislativo SEM o devido parecer prévio do Conselho Municipal de Planejamento e Desenvolvimento – COMUPLAN. Em reunião de 06.12.10, o orçamento foi aprovado, indevidamente, pela Câmara de Vereadores, considerando que o § 1º do art. 50 da Lei Municipal nº 3.377/06 é taxativo:

Os projetos de lei do Plano Plurianual, da Lei de Diretrizes Orçamentárias e do Orçamento Anual encaminhados à Câmara Municipal serão acompanhados de parecer prévio do Conselho Municipal de Planejamento e Desenvolvimento.

3.                    Desse modo, com base no art. 127 da Constituição Federal, solicitamos-lhe a gentileza de adotar as medidas legais necessárias para:

a)    tornar SEM EFEITO o Orçamento Anual relativo a 2011, aprovado pela Câmara Municipal em 06.12.10; e

b)    fazer com que as instituições denunciadas cumpram, no mínimo, o § 1º do art. 50 da Lei Municipal nº 3.377/06, acima transcrito.

4.                    Impende-nos ressalvar que as decisões do COMUPLAN são feitas mediante resolução aprovada por maioria simples dos presentes (Art. 7º do Decreto nº 3.101/06). Tendo em vista a importância do Orçamento Anual para o município, consideramos essencial que o parecer prévio seja:

a)    emitido com base em documentos técnicos elaborados pelos membros dos Comitês Técnicos previstos no art. 4º do Decreto nº 3.101/06; e

b)    referendado pelos representantes da sociedade civil indicados pela Ordem dos Advogados do Brasil – OAB e pelo Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia – CREA.

5.                    Nossa preocupação é procedente, porquanto, na última reunião do Conselho de 19 (dezenove) membros, segundo consta, somente 9 (nove) estiveram presentes. Um parecer prévio de tamanha envergadura que espelhe realmente os anseios e as necessidades do povo no Orçamento do Município exige, além de sólidos conhecimentos específicos, abnegado esforço conjunto da totalidade dos membros – quorum passível de ser observado, haja vista que todos os titulares têm os seus respectivos suplentes.

6.                    Acrescentamos que o dispositivo legal não cumprido traz em si toda a filosofia do processo de gestão democrática inaugurado pela Lei Federal nº 10.257/01, denominada Estatuto da Cidade, considerando que o COMUPLAN representa a sociedade civil no Poder Executivo. Levando-se em conta que, além disso, o Plano Diretor é o instrumento básico da administração do município (Art. 182 da Constituição Federal), também se tornam pertinentes na presente denúncia os tópicos seguintes constantes do Estatuto:

§ 3º do art. 4º:
Os instrumentos previstos neste artigo que demandam dispêndio de recursos por parte do Poder Público municipal devem ser objeto de controle social, garantida a participação de comunidades, movimentos e entidades da sociedade civil.

§ 1º do art. 40:
O plano diretor é parte integrante do processo de planejamento municipal, devendo o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias e o orçamento anual incorporar as diretrizes e as prioridades nele contidas.

§ 4º do art. 40:
No processo de elaboração do plano diretor e na fiscalização de sua implementação, os Poderes Legislativo e Executivo municipais garantirão: (i) a promoção de audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade; (ii) a publicidade quanto aos documentos e informações produzidos; e (iii) o acesso de qualquer interessado aos documentos e informações produzidos.

Art. 43:
Para garantir a gestão democrática da cidade, deverão ser utilizados, entre outros, os seguintes instrumentos: (i) órgãos colegiados de política urbana, nos níveis nacional, estadual e municipal (é o caso específico do COMUPLAN); (ii) debates, audiências e consultas públicas; (iii) conferências sobre assuntos de interesse urbano, nos níveis nacional, estadual e municipal; e (iv) iniciativa popular de projeto de lei e de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano.

7.                    Lamentavelmente, a inobservância do § 1º do art. 50 da Lei nº 3.377/06 é apenas uma das graves irregularidades que vem ocorrendo na gestão de nosso município. Outras podem ser citadas, algumas até mais relevantes. Vejamos alguns exemplos.

8.                    O Plano Diretor do Município, instituído pela Lei nº 3.377/06, foi elaborado e vem sendo executado sem a participação da população. Contrariou e está contrariando, portanto, o princípio constitucional da participação popular que levou a justiça de São Paulo a suspender a revisão do Plano Diretor daquela capital. Na sentença, o Exmo. Sr. Juiz, Dr. Marcos Porta, salienta que

a gestão democrática impõe à municipalidade que, do início até o término dos trabalhos do Plano Diretor, realize campanhas massivas de conscientização e convocação dos munícipes, não só para audiências públicas, mas sim, PARA PROMOVER A SUA DEVIDA PARTICIPAÇÃO NO PROCESSO ADMINISTRATIVO COMO UM TODO.

9.                    O fato de a elaboração do Plano Diretor não ter contado com AMPLA participação da população está tacitamente reconhecido no Ofício N.PJ. 130/2010, de.20.10.10, da Procuradoria Jurídica do Município (copia anexa).

10.                  Ademais, o Plano Diretor não prioriza as classes marginalizadas e, conforme consta do Estatuto da cidade: guia para implementação pelos municípios e cidadãos (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2001, p. 45):

a política de desenvolvimento urbano estabelecida pelo Município no Plano Diretor, que não tiver como prioridade atender as necessidades essenciais da população marginalizada e excluída das cidades, estará em pleno conflito com as normas constitucionais norteadoras da política urbana, com o sistema internacional de proteção dos direitos humanos, em especial com o princípio internacional do desenvolvimento sustentável.

11.                  O § 2º do art. 50 da Lei nº 3.377/06 determina que “Os instrumentos que requeiram dispêndio de recursos por parte do poder público municipal deverão, quando da sua aplicação, ser submetidos à aprovação do Conselho Municipal de Planejamento e Desenvolvimento”. Tal dispositivo – que também não vem sendo cumprido – tem como referência o § 3º do art. 4º da Lei nº 10.257/01, denominada Estatuto da Cidade, seguinte:

Os instrumentos previstos neste artigo que demandam dispêndio de recursos por parte do Poder Público municipal devem ser objeto de controle social, garantida a participação de comunidades, movimentos e entidades da sociedade civil.

12.                  Não há transparência nos negócios públicos, portanto, o processo de gestão democrática – se é que existe – encontra-se mortalmente ferido. Eis outros dispositivos contrariados:

Art. 48 da LC nº 101/0:
São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos.

Inciso II do parágrafo único do art. 48 da LC 101/00:
Liberação ao pleno conhecimento e acompanhamento da sociedade, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira, em meios eletrônicos de acesso público; Redação alterada p/LC 131/2009.

13.                  Especificamente quanto ao COMUPLAN, pode-se afirmar, com segurança, que se trata de um arremedo de conselho. Desse modo, a participação da população – ou seja, a parceria entre a sociedade civil e o Poder Executivo, conforme previsto no Estatuto da Cidade – acha-se totalmente comprometida ou mesmo inexistente. Neste tópico, as perguntas seguintes são pertinentes:

a)    onde está funcionando o Conselho, ou seja, onde os seus membros estão desempenhando suas inúmeras atribuições, e onde a população pode apresentar-lhes os seus anseios e as suas necessidades?

b)    de suas inúmeras atribuições (Art. 2º do Decreto nº 3.101/06), “o que já foi realizado”, “o que está sendo realizado” e “o que será realizado nos próximos meses”?

c)    existe independência nas decisões do Conselho, tendo em vista que o Presidente e o respectivo Suplente são os Secretários de Atividades Urbanas e de Administração, ambos nomeados pelo Chefe do Poder Executivo e a ele subordinados (Art. 5º do decreto mencionado)?

d)    Onde estão sendo divulgadas as suas decisões, os seus trabalhos e, especialmente, as atas de suas reuniões, conforme prevê o inciso XIV do art. 2º do Decreto nº 3.101/06?

14.                 O § 1º do art. 40 da Lei nº 10.257/01 estabelece que o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e Orçamento Anual (LOA) devem incorporar as diretrizes e prioridades do Plano Diretor. Contrariando leis, as informações relativas a tais instrumentos não são divulgadas, mas, à vista das circunstâncias, pode-se afirmar, com relativa segurança, que a coerência entre esses instrumentos de planejamento e gestão não vem sendo observada. É muito provável que cada um esteja “atirando” para lados diferenciados, de acordo com os interesses das lideranças que se encontram no poder e com as circunstâncias de cada momento.

15.                 O prazo de revisão das leis previsto no parágrafo único do art. 51 da Lei nº 3.377/06, venceu-se em 17.10.07, mas, até a presente data, as revisões não foram realizadas. As leis se referem a: Perímetro Urbano; Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo; Código de Posturas; Código de Obras; Código Tributário; Código Ambiental e a Agenda 21 Local.

16.                 O Fórum de Acompanhamento do Plano Diretor e a Conferência Municipal de Desenvolvimento previstos para o segundo semestre de 2007 e primeiro semestre de 2009 (Inciso XII do art. 2° e parágrafo único do art. 15 do Decreto nº 3.101/06) nunca foram realizados. E os membros do COMUPLAN nomeados e empossados de acordo com o Decreto nº 3.141/07 nunca se reuniram, em que pese ser atribuição do Presidente do Conselho “convocar e presidir as reuniões do colegiado” (Inciso I do art. 6º do Decreto nº 3.101/06).

17.                  As irregularidades mencionadas levaram a Câmara Municipal a aprovar, em setembro passado, por unanimidade, requerimento do Vereador, Sargento Joel (cópia anexa), solicitando ao Poder Executivo a revisão da Lei nº 3.377/06 – Plano Diretor de Muriaé. O pedido de revisão foi negado através do evasivo ofício acima mencionado, assinado pela Senhora Procuradora Jurídica do Município, e não pelo Excelentíssimo Senhor Prefeito Municipal.

18.                  Conforme se observa, Senhor Promotor, não se trata apenas de reparar uma grave falha. Trata-se, também, de evitar que outras falhas persistam e novas falhas venham acontecer no futuro. Nesse sentido, estamos nos referindo, principalmente, aos aspectos disciplinares e pedagógicos dos dispositivos legais seguintes:

Lei nº 10.257/01 - Estatuto da Cidade:
Sem prejuízo da punição de outros agentes públicos envolvidos e da aplicação de outras sanções cabíveis, o Prefeito incorre em improbidade administrativa, nos termos da Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, quando: impedir ou deixar de garantir os requisitos contidos nos incisos I a III do § 4º do art. 40 desta Lei (Inciso VI, do art. 52).

Lei nº 8.429/92 – Improbidade Administrativa:
Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício (Inciso II do art. 11).

Lei Municipal nº 3.824/09 (Estatuto dos Servidores Públicos Municipais de Muriaé):
O servidor público municipal responde civil, penal e administrativamente pelo exercício irregular de suas atribuições (Art. 139); e
A responsabilidade civil-administrativa resulta de ato omissivo ou comissivo praticado no desempenho do cargo ou função (Art. 141).

19.                  Que omissões ocorreram não se discute, porque, afora o princípio legal de que “ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece”, informalmente, todas as instituições envolvidas foram alertadas para a exigência do parecer prévio no Orçamento Anual, conforme e-mails e matérias correspondentes divulgadas em blogs locais (cópias anexas). Resta, portanto, decidir se a omissão do parecer prévio do COMUPLAN no Orçamento Anual se enquadra em, pelo menos, uma das condições seguintes:

a)    “impedir ou deixar de garantir os requisitos contidos nos incisos I a III do § 4º do art. 40 desta Lei”;

b)    “retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício”;

c)    “ato omissivo ou comissivo praticado no desempenho do cargo ou função”.

20.                  Conscientes de estarmos cumprindo um dever de cidadania, ratificamos a solicitação feita no item 3 e pedimos sua especial atenção para as ressalvas constantes dos itens 4 e 5 deste expediente. Quanto a possíveis providências disciplinares e pedagógicas, em que pese a triste realidade das falhas e a clareza dos normativos (Itens 18 e 19), esse Ministério Público melhor o dirá, ponderando, certamente, os anseios e as necessidades da população – em especial, das classes marginalizadas –, de acordo com as suas atribuições de defender a ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis.

Colocamo-nos à disposição para quaisquer esclarecimentos adicionais porventura necessários e valemo-nos da oportunidade para reiterar nossos protestos de estima e consideração.

Muriaé (MG), 15 de dezembro de 2010


(ASSINATURAS EM ANEXOS)



Ao
Ilustríssimo Doutor
FÁBIO RODRIGUES LAURIANO
DD. Promotor de Justiça
Muriaé (MG)